'Ontem chorei. Por tudo que fomos. Por tudo o que não conseguimos ser. Por tudo que se perdeu. Por termos nos perdido. Pelo que queríamos que fosse e não foi. Pela renúncia. Por valores não dados. Por erros cometidos. Acertos não comemorados. Palavras dissipadas. Versos brancos. Chorei pela guerra cotidiana. Pelas tentativas de sobrevivência. Pelos apelos de paz não atendidos. Pelo amor derramado. Pelo amor ofendido e aprisionado. Pelo amor perdido. Pelo respeito empoeirado em cima da estante. Pelo carinho esquecido junto das cartas envelhecidas no guarda- roupa. Pelos sonhos desafinados, estremecidos e adiados. Pela culpa. Toda a culpa. Minha. Sua. Nossa culpa. Por tudo que foi e voou. E não volta mais, pois que hoje é já outro dia. Chorei. Apronto agora os meus pés na estrada. Ponho-me a caminhar sob sol e vento. Vou ali ser feliz e já volto.'

Caio Fernando Abreu

“As coisas tem que passar, os dias têm que mudar, os ares têm de ser novos e a vida continua, com ou sem qualquer um.”


             Caio Fernando Abreu

Se eu pudesse eu te daria o céu, com noites estreladas, lua-de-mel, e palavras de amor escritas em papel. Te ofereceria cada suspiro meu, cada passo dado até agora em falso, por caminhos que não me fizeram seu. Se eu pudesse eu traria para o horizonte o mar, para que você abandone o sonho de fugir daqui e para que amar fosse o único porto para seu corpo navegar. Deixaria cada mania, abandonaria os medos que tem me rondado, só para todo dia ter você ao meu lado. Se eu pudesse eu limparia as nuvens e faria sair o Sol, para o astro rei ver toda a sua beleza, seu sorriso, sua alegria, que, ao partir, de lágrimas mancharam meu lençol. Se eu pudesse eu pararia a hora naquele momento em que te conheci, conservaria o nosso abraço, e esqueceria a dúvida de para aonde o vento te levou agora. Se eu pudesse eu mudaria o mundo, interromperia cada segundo que nos afastaram sem eu saber por quê. Se eu pudesse eu te teria, se eu pudesse eu poderia e não apenas rimaria palavras que tentam trazer você. Se eu pudesse e você quisesse, se o meu lamento afastasse da garganta o nó, se o tempo voltasse e com ele se fosse aquele tempo que não fez de nós um só.